Ser migrante, ser expatriado e ser estrangeiro

jul 18, 2022 | Famílias no Exterior

O tema da migração é sempre presente na plataforma Mães Mundo Afora e hoje eu trouxe algumas reflexões a partir de Filosofia da Imigração, área que conheci lendo os livros das autoras italianas Francesca Rigotti e Donatella di Cesare.

Cada vez mais, encontramos textos de mães que dão dicas ou compartilham suas experiências de adaptação em um outro país. E, sim, eu sou uma delas! Há também vários livros que funcionam como manuais, com o passo a passo para a adaptação em uma nova cultura.

Todos muito válidos, mas dessa vez mergulhei na sociologia, antropologia e na filosofia. E eu me deparei com novas questões sobre o mesmo tema…

As primeiras migrações aconteceram há 6 milhões de anos

O cientista italiano Guido Barbujani fala que os movimentos migratórios sempre existiram.  Na sua visão, a primeira migração aconteceu há 6 milhões de anos quando o homem desceu da árvore e passou a ser bípede.  Depois, aconteceram as saídas da África para outros continentes, e mais tarde, a migração para as Américas.

No livro – Il giro del mondo em 6 milioni di anni (tradução livre seria A volta ao mundo em 6 milhões de anos) ele fala dos diversos movimentos migratórios. Desde a descida da árvore até os atuais. Ele inclui os movimentos dos refugiados que fogem da guerra, da pobreza ou de perseguições políticas e religiosas. Aborda também, a trajetória de pessoas de países subdesenvolvidos que migram em busca de estudos, universidades ou melhores oportunidades de trabalho.

Nunca havia pensado neles dessa forma, mas faz todo sentido pensar que enquanto houver desigualdade no mundo, haverá migração.

Migração e expatriação não são sinônimos
Embora algumas pessoas utilizem os termos migrante, expatriado e, mais atualmente, expat como sinônimos, eles trazem algumas ideias pré-concebidas.

De uma forma bem simplificada, a emigração é o movimento de saída de um lugar de origem. Já a imigração é o movimento de entrada / chegada em um novo lugar. Vale dizer que os movimentos migratórios ocorrem entre e intra países, ou seja, a pessoa pode mudar de cidade, estado ou de país.

 Já o termo expatriação tem sido utilizado para falar de situações em que uma empresa transfere um funcionário (executivo) para desempenhar uma determinada função em uma filial da empresa em outro país.  Pode ser por um período inicial de 6 meses até 5 anos. Envolve a transferência de toda a família e geralmente a empresa oferece uma série de benefícios para ajudar a família neste processo.

Na grande maioria das vezes o expatriado é o pai. A mãe costuma ser a responsável pela acomodação e adaptação da família ao novo país. Enquanto o marido sai para trabalhar (e interage com outras pessoas), as crianças vão para escola (se relacionam com outras pessoas), a mãe / esposa fica responsável pela casa , pelo preparo da comida, pela logística das crianças.

Nessas situações, a vida, para ela, pode ser muito monótona e solitária.

As mulheres abandonaram família, amigos, casa e muitas vezes, uma carreira. Quando chegam no novo país são estrangeiras que perderam suas referências. É bastante comum não terem com quem conversar. Passam os dias sozinhas e em algumas situações, são dependentes do marido ou intérprete por não dominarem o idioma. E é por tudo isso que os departamentos de Recursos Humanos de muitas empresas dizem que o fator crítico para o sucesso de uma expatriação é a adaptação e integração da esposa do funcionário.

 Migrantes são estrangeiros

Tanto os imigrantes quanto os expatriados são estrangeiros. Mas, ser expatriado parece melhor do que ser imigrante. O expatriado está de passagem pelo novo país, ele já chegou com um emprego, com um bom salário e tem uma posição privilegiada na sociedade.

Os imigrantes são rotulados como intrusos, que vão ocupar os postos de trabalho dos cidadãos locais e em muitos casos, são vistos como verdadeiras ameaças à segurança e a ordem. Essa imagem ameaçadora é reforçada, muitas vezes, pelas metáforas utilizadas pra descrever tais movimentos.

Se por um lado, o mundo globalizado facilitou o processo de migração, o direito de ir para outro lugar em busca de melhores condições, a divisão do planeta Terra em Estados / Nações criou várias barreiras que fazem com que os imigrantes oriundos de países pobres não sejam bem aceitos aonde eles chegam. Temos visto com frequência a população local defender a posição: “nós versus eles”, “os nossos (direitos) primeiro!” que acaba sendo uma luta entre os nossos, os cidadãos e eles, os estrangeiros.

Quando nós somos os outros – você se preparou para ser estrangeiro?

A qualquer momento na nossa trajetória como imigrante, expatriada ou expat podemos sofrer preconceito. Eles podem vir de pessoas que nos percebem como ameaças tanto para a sua cultura, quanto para a economia.

Atualmente moramos na Itália e temos a cidadania italiana. Más é nítido que para qualquer italiano seremos sempre uma família de brasileiros que mora na Itália. Temos acesso à saúde, educação, podemos trabalhar, temos todos os direitos de quem é italiano, mas nossos nomes denunciam a nossa condição de estrangeiro.

Eu tenho o sobrenome do meu marido e as crianças têm o sobrenome do pai e da mãe. Acontece que por aqui as mulheres não acrescentam o nome do marido e as crianças usam apenas o sobrenome do pai. No caso de nossa família, a combinação de nossos nomes e sobrenomes reflete mais informação do que apenas como nos chamamos.

Este texto foi publicado em www.maesmundoafora.com