A Recompensa pelo trabalho – o tenis tambem por der um esporte de equipe
No último texto escrevi sobre os aprendizados que acredito que os meus filhos, atletas infanto.juvenis, levarão das quadras para a vida. Tenho um menino de 12 e uma menina de 16 que jogam tênis e há cinco anos entraram para o mundo do esporte de alto rendimento.
O tênis é um esporte individual. Na maioria das vezes o atleta está sozinho em quadra para tomar inúmeras decisões, não tem com quem dividir a responsabilidade por ter perdido um jogo, nem com quem comemorar uma vitória. Ele é o principal responsável pelo resultado e nesse sentido, a pressão
pelo bom desempenho é enorme.
Aqui me refiro ao tênis, mas tudo isso pode ser aplicado aos atletas de outros esportes e também aos bailarinos, músicos e atores.
As dúvidas que me acompanham
Às vezes me pergunto: “será que vale a pena tanta pressão?” Aliás, tenho vários questionamentos.
(1) Será que nós, pais, devemos incentivar a prática de um único esporte ou seria válido estimular a experimentação de esportes diferentes?
2) Será que podemos privilegiar/ permitir os esportes individuais – como tênis, natação e tantos outros, ou devemos direcionar as crianças para os esportes de equipe – como futebol, vôlei, basquete etc.?
(3) Será que vale a pena investir na participação de torneios? Além do custo financeiro que envolve deslocamento, hospedagem, alimentação e o pagamento de inscrição, em alguns casos, o atleta precisa faltar aula e os pais precisam estar disponíveis para leva-los às competições.
Esporte individual também tem competição de equipe
Apesar de ser um esporte individual, o tênis permite que as crianças participem de torneios de equipe. No Brasil, até 2017, quando nos mudamos, o único torneio de equipe era a Copa das Federações. Nesse evento, os melhores atletas de cada estado, em cada uma das categorias, são convocados para formar uma equipe e jogar um torneio no mês de julho. Por aqui existe o Campionato a Squadra .
Copa das Federações
A Copa das Federações é um torneio grande, com atletas de todos os estados do Brasil, os adversários de cada estado se tornam amigos de equipe e apesar do clima de competição, prevalece o espírito de equipe e união. Meu filho ainda não tinha idade para participar, mas eu cheguei a viajar com a minha filha e o grupo do Rio de Janeiro por duas vezes.
Cada confronto corresponde a dois jogos de simples e um jogo de dupla. As equipes podem ser formadas por dois a cinco atletas. Todos os atletas podem jogar ou o capitão da equipe pode definir a melhor estratégia para vencer cada confronto.
na copa das Federacoes, a equipe sempre esta por perto torcendo e incentivando e o tecnico fica na quadra e pode falar com o atleta nas viradas de lado. Na Italia tambem é assim.
Campionato a Squadra na Itália
Aqui na Itália é um pouco diferente. Cada clube forma as suas equipes e compete com os clubes da cidade e da região, entre os meses de janeiro e junho. O torneio é bastante longo e as crianças treinam o ano inteiro com a sua equipe.
No final de julho e em agosto acontecem as etapas nacionais. O formato do confronte é o mesmo – duas partidas de simples e uma partida de dupla. Os primeiros confrontos são os mais fáceis, e conforme as equipes avançam na competição, os jogos ficam cada vez mais difíceis e o clima da
competição mais acirrado.
As emoções neste tipo de torneio são outras. Agora, as crianças se sentem responsáveis pelos resultados da equipe. Por exemplo, ter que ganhar a sua partida para disputar o confronto da equipe em uma partida de dupla decisiva fez meu filho ficar sem dormir, sem comer e até vomitar de nervoso.
Estresse nos torneios de equipe
No ano passado meu filho estava tão tenso que perdeu a partida e a equipe não se qualificou para a etapa seguinte. Foi a maior frustração. No início de agosto (de 2020), aconteceu algo parecido. Ele precisava vencer a sua partida de simples, para a equipe tentar ganhar o confronto em uma partida
decisiva de dupla e poder disputar a vaga de campeão regional.
João só tem 12 anos e sentiu a pressão da responsabilidade que ele tinha nas suas mãos. Ele conseguiu, mas chorou muito enquanto jogava e
mais ainda quando terminou. Chorou de nervoso.
De longe, apenas observei o que estava acontecendo. O meu coração estava apertado e eu só queria abraçar o meu filho e dizer “estou aqui com você!”. Na verdade já quis dizer “você não precisa fazer isso, se não quiser”, nem sei o que eu deveria dizer. E, com muita frequência me pergunto – o que eles
aprendem com tanto estresse?
A resposta chegou algumas horas depois, quando meu pequeno atleta, todo feliz, me contou que o seu treinador estava orgulhoso do seu comportamento e amadurecimento, pois há um ano atrás ele certamente teria perdido a partida.
Viagens com a equipe
Os deslocamentos para os jogos de equipe são feitos com o treinador. A participação dos pais é muito bem-vinda mas não é necessária. Nas etapas nacionais, as crianças dormem fora de casa e os custos ficam por conta da Federação Italiana de Tênis e do clube que a equipe representa.
As crianças sonham com essas viagens. É como aquelas que já fizemos no Brasil ( para a Copa das Federações) só que sem os pais e com um grupo de amigos. Para as crianças é como se fosse o prêmio pelo ano de treinamento puxado e de dedicação ao esporte.
Aprendizados dos torneios de equipe
Os aprendizados são inúmeros. Nos torneios de equipe, o treinador fica em quadra com o atleta que conta com o apoio da torcida, seus amigos de equipe e familiares, ao lado da quadra. A foto de abertura deste texto mostra isso.
O atleta não está sozinho e nem sempre a equipe vencedora é a que tem o atleta melhor rankeado. A ntegração entre os membros da equipe e sua liderança fazem toda a diferença.
A escalação para cada confronto
Nesse tipo de torneio pode acontecer de algum atleta não jogar nenhuma partida – o que pode gerar uma grande frustração no atleta e nos seus pais. Pode acontecer, por exemplo, da equipe disputar três partidas – duas simples e uma dupla, o que daria para, em tese, quatro atletas jogarem e o treinador escolher apenas dois.
Meus filhos amam jogar os torneios de esquadra. Minha filha é aquela que faz de tudo pela equipe. Se tiver que jogar, joga. Se não for escalada para as partidas, estará presente na torcida, dando o apoio que precisar. Ela curte demais. No ano passado sua equipe foi campeã regional na categoria até 16 anos.
Meu filho é o número 2 da sua equipe, às vezes faz duas partidas no confronto, adora representar a equipe, mas ainda não lida muito bem com tanta responsabilidade.
Ganho de autonomia
As crianças, quando viajam com o treinador aprendem a cuidar das suas coisas. São responsáveis por tudo, desde cuidar das roupas, raquetes, tênis, até a hora de passar o repelente ou o protetor solar, além de ficar de olho se o celular está carregado. Ah, eles também têm que cuidar do dinheiro (para as coisas pequenas, um sorvete, uma bebida) e da chave do quarto. Até hoje ouvimos as histórias deliciosas que eles nos contam.
Atualização:
Em 2020 publiquei dois textos sobre os aprendizados do tenis para a vida e, inspirada pela minha amiga Silvina Ramal que fez uma serie de posts no seu perfil do Instagram sobre tenis e business, vou contar como anda o interesse pelo tenis por aqui.
Mari tem quase 20 anos. Fez toda a escola superior (o ensino médio) aqui na Italia, teve muitas dificuldades com o italiano, mas sempre conciliou a escola e o esporte. Chegou a ser atleta de 2ª categoria aos 17 anos, mas por conta da entrada na universidade, diminuiu a intensidade dos treinos e a frequência dos torneios. Estuda na melhor universidade italiana, estuda muito e colhe os resultados. Sabe que ela, somente ela, é responsável pelos resultados, sabe que com trabalho dedicação e persistência, os resultados aparecem. Aplicou para uma universidade americana – queria ser aluna com bolsa atleta, mas avaliou as ofertas e fez a sua escolha.
Joao tem 15 anos. Estuda em um colégio tradicional e super forte! Tem aulas de grego e latim, da pra acreditar! Treina todos os dias 2,5hs em quadra e 1 hora de preparação física. Durante o período de escola até joga torneios, mas a prioridade é a escola. No verão passado participou de vários torneios nacionais (na Italia) e internacionais – Áustria, Eslovênia, Alemanha e Croácia. Fez dupla com um menino russo, que por conta da guerra da Ucrania, era vítima de preconceito, teve dificuldade de se comunicar com os portugueses (apesar de ser a mesma língua o sotaque é bem diferente!), mas se virou muito bem com o inglês e o espanhol.
Aqui em casa dizemos que só frequentar a escola é fácil, só se dedicar ao tênis, mais fácil ainda, mas fazer uma boa escola e ter bons resultados é para poucos. Não estou julgando quem faz escolhas diferentes das nossas, mas esses são os valores da minha família. Poucos atletas dessa idade serão jogadores profissionais no futuro. Oferecemos o melhor treinamento possível, investimos tempo, dinheiro e tudo o que for possível, mas cursar uma boa escola é inegociável.
Vejo que ter um bom desempenho nas duas frentes tem feito muito bem para a sua auto estima e para a sua integração social.